Regime de separação de bens e enriquecimento ilícito

Quem casa com regime de separação de bens no afã de retirar do outro a parte que normalmente lhe caberia pode muito bem cair na própria armadilha. Enuncia a Súmula 377 do STF:

‘No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento’.

Recentemente fui procurada por uma senhora me questionando isso. Ela abandonou uma carreira promissora a pedido do noivo que disse que ela teria uma vida de rainha se casando com ele e que sua renda não faria falta ao casal. Alegando mil razões, a convenceu de escolher o regime da separação de bens. Ele, rico, ficou cada vez mais rico e ela, fora do mercado, cada vez mais velha e desatualizada. Pois bem. Agora com o divórcio batendo às portas do casal o bem sucedido marido lhe disse que ela não tem direito a nada. Regateia até a pensão das crianças. Neste sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES. INVENTÁRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 377 DO STF. O casal não celebrou pacto antenupcial optando pela adoção de um regime de bens, mas, sim, casou de acordo com o regime imposto pela legislação vigente à época, considerada a idade dos nubentes, previsto no artigo 258, inciso II do Código Civil Brasileiro de 1916. Assim, os bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento, nos termos da Súmula 377 do STF, se comunicam o que implica que não há como afastar a sobrevivente da partilha. LITIGÂNCIA DE MÁ-FE. Cumpre afastar o pedido de condenação do agravante por litigância de má-fé, visto que não observada qualquer das condutas previstas pelo artigo 17 do CPC. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. (Agravo de Instrumento Nº 70056385123, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 17/10/2013) – grifo nosso

APELAÇÃO CÍVEL. DIVÓRCIO LITIGIOSO. REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS. COMUNICAÇÃO PATRIMONIAL SE HOUVER PROVA DE AQUISIÇÃO CONJUNTA. DOAÇÃO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. POSSIBILIDADE. PENSÃO ALIMENTÍCIA. MANUTENÇÃO. 1 – A aplicação da Súmula 377 do STF, que estabelece a comunicabilidade dos aquestos no regime da separação obrigatória de bens, não prescinde da prova do esforço comum de ambos os cônjuges na formação do patrimônio, pena de favorecer o enriquecimento sem causa. 2 – A doação de um cônjuge ao outro, na constância do matrimônio, não deve ser levada à partilha, uma vez que é possível a sua ocorrência, mesmo no regime de separação obrigatória de bens, seja porque não há proibição legal, seja porque a imposição da restrição representa ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3 – É princípio do direito alimentar que, observado o caso concreto, tanto quanto possível, a pensão seja fixada, considerando-se a capacidade do alimentante e o padrão de vida propiciado à alimentada. 4 – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJGO, APELACAO CIVEL 352977-08.2012.8.09.0111, Rel. DES. GERSON SANTANA CINTRA, 3A CÂMARA CIVEL, julgado em 02/09/2014, DJe 1623 de 08/09/2014) – grifo nosso

Muitos juízes se negam a aplicar essa súmula. Mas isso ocorre de acordo com as peculiaridades de cada caso. O que se vê é que quando a má fé resta patente e quando há enriquecimento sem causa da parte mais favorecida pelo regime, a Súmula se faz presente nas decisões judiciais.

Advogada formada pela Universidade de Uberaba em 2001. Inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Goiás sob o nº. 20.975. Pós Graduada em Direito Civil e Processual Civil pelo Instituto de Estudo e Pesquisa Científica sediado em Goiânia/GO e em Direito Processual Penal pela UFG. Profissional atuante em diversas áreas do Direito, sendo que desde o início de sua carreira prestou serviços a escritórios de advocacia de renome no Estado de Goiás. Autora do artigo ‘Os direitos da esposa à luz do Código Civil de 2002’, publicado na Revista do IEPC, ano 2, nº. 3, 1º semestre de 2005. Membro da Comissão de Direito Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Goiás. Atualmente é sócia do Escritório Guilherme Soares Advogados.

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